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Publicado: 14/01/2019

Pequenas e grandes cooperativas precisam se dar as mãos e avançar em gestão e tecnologia

Você se lembra da G. Aronson? E da Vasp? Provavelmente, sim. Talvez não sejam do seu tempo ou da sua cidade as Casas da Banha, Mesbla, Arapuã e Mappin. Mas do Bamerindus você deve se recordar. O que essas empresas têm em comum? Todas eram muito grandes – mas faliram. O menos óbvio é que o motivo foi o mesmo para todas elas: erros de gestão. “Fiz muita besteira”, reconheceu o lituano Girz Aronson, criador da rede de lojas que levava seu nome e que chegou a faturar R$ 250 milhões por ano em 35 lojas.

Depois de ir à falência, em 1999, ele disse em mais de uma entrevista que geria seu negócio com a simplicidade de quem compra por 10 e vende por 15. Essa aritmética simples funcionou durante muito tempo, mas chegou uma hora que foi preciso investir em gestão, e Aronson errou ao não fazer isso. “Eu cresci demais e não tinha capacidade para administrar tantas lojas”, contou ele.

O que o caso da G. Aronson e dessas outras empresas pode ensinar ao cooperativismo de um modo geral? A lição principal é que o mundo ficou mais complicado, mais competitivo e que não é mais possível enfrentar a concorrência com as mesmas ferramentas do passado. Os produtos ou serviços de uma cooperativa podem ser ótimos, o preço pode até ser baixo, mas isso não basta. É preciso se modernizar constantemente.

Gestão e tecnologia formam uma dupla sem a qual não é mais possível sobreviver – e muitas cooperativas ainda estão pensando o que fazer a respeito. Para Dorly Dickel, da consultoria gaúcha DSM, já passou da hora. “Essa discussão já deveria ter sido levada a um nível superior, já deveríamos estar discutindo questões de implantação de um ramo de tecnologia que atenda o cooperativismo”, afirma o especialista. “E isso não foi pensado ainda.”

As pequenas cooperativas são as que mais sofrem, seja por falta de recursos financeiros seja por falta de preparo para utilizá-las. Para Dickel, é imprescindível a oferta de tecnologia às cooperativas.

“Sem isso, corremos o risco de restringir o crescimento de todas as cooperativas, inclusive as que já são grandes”, afirma. “E as grandes, só pelo fato de serem assim identificadas, não podem, evidentemente, serem atacadas ou penalizadas com o estancamento de seus próprios processos de desenvolvimento”, acrescenta. “Seria uma ignomínia sem precedentes, se permitíssemos isso.”

O consultor diz ainda que, por outro lado, enquanto a humanidade não reconhecer fraternalmente a necessidade de reduzir as injustiças sociais, mecanismos de regulação também serão imprescindíveis. “A regulação das relações sociais e de produção é de competência do Estado”, diz Dickel. “As diferenças aqui discutidas, se existentes, devem ser identificadas e reduzidas pela equanimidade de tratamento.”

Mudanças exigem mais intercooperação

Mas não é por serem pequenas que cooperativas devam ser tratadas como inferiores. O cooperativismo é maior que todas elas juntas por definição. “As cooperativas precisam reconhecer o valor do princípio da intercooperação, para que as grandes impulsionem o crescimento das menores, reduzindo a aludida diferença”, analisa Dickel.

Marcelo Correa Medeiros, instrutor de educação corporativa no Sicoob Central SC/RS, tem a mesma opinião. “Acredito que a intercooperação, ou a cooperação entre cooperativas, seja uma grande solução para que as pequenas possam se manter e crescer neste novo cenário tecnológico”, opina. “É a união de forças, de pessoas, de capital, de estruturas, em prol de um bem maior, que é gerar o desenvolvimento econômico e social dos seus associados”, acrescenta Medeiros, autor do livro “O Milagre da Cooperação”.

“Estamos passando por tempos de grandes mudanças, algo sem precedentes na história da humanidade, considerando a velocidade e a abrangência das transformações que estamos vivenciando”, diz Medeiros, em referência ao conjunto de rápidos avanços tecnológicos chamado de quarta revolução industrial. “Dentro desse contexto, acredito que as cooperativas possuem um papel fundamental na inclusão das pessoas, dos seus associados, nessa nova economia que se desenha”, acrescenta. “Crescem cada vez mais o conceito e a prática do compartilhamento de bens, serviços, habilidades e conhecimentos, na chamada economia colaborativa ou compartilhada – e a colaboração é algo que está no DNA da doutrina cooperativista.”

É necessário rever valores e princípios

Existe, no entanto, uma ponte que as cooperativas precisam cruzar para entrar com o mínimo de sucesso nesse novo ambiente de negócios e tecnológico.

“É necessário uma revisão de valores e princípios por parte dos membros, e estes devem buscar um maior equilíbrio entre seus interesses particulares e seus interesses coletivos enquanto cooperados”, conclui um estudo de caso realizado por professores e alunos do curso de administração pública e gestão social da Universidade Federal de Viçosa, em Minas Gerais.

“A falta de capacitação profissional dos gestores revela-se como propulsora da perda de motivação, da falta de participação e do baixo comprometimento dos associados.”

Embora se trate de um estudo de caso, o de uma cooperativa de granjeiros, o trabalho reflete um quadro que se repete em todo o cooperativismo brasileiro. As considerações finais do trabalho, intitulado “Gestão de cooperativas: um estudo sob o olhar do cooperado”, apontam para a necessidade de promover a educação cooperativista de forma contínua como ponto de partida, pois boa parte dos cooperados desconhece os conceitos básicos do cooperativismo e age como se estivesse em uma empresa convencional, pois não participa de decisões e desconhece seu papel na organização.

“A falta de união entre os cooperados e a existência de um grupo de associados estereotipado como privilegiado é um fato que diminui a união e a efetiva cooperação entre os associados”, conclui o estudo. “A união está sendo substituída pelos interesses particulares, e isso faz com que os cooperados percam a motivação, a participação e o comprometimento com a organização”, acrescenta o texto. “Surge também a necessidade de capacitação profissional dos executivos e profissionais das cooperativas, bem como dos cooperados.”

Muitas cooperativas justificam a falta de capacitação por não terem recursos financeiros para fazer cursos, por exemplo. Mas essa é uma faca de dois gumes. Elas podem não ter recursos porque não fazem uma gestão adequada e porque não investem em formação. “O Fates/Rates deve ser aplicado fundamentalmente em educação dos sócios das cooperativas e de seus dependentes”, lembra Dickel, referindo-se à Reserva de Assistência seus associados, nessa nova economia que se desenha”, acrescenta. “Crescem cada vez mais o conceito e a prática do compartilhamento de bens, serviços, habilidades e conhecimentos, na chamada economia colaborativa ou compartilhada – e a colaboração é algo que está no DNA da doutrina cooperativista.” Técnica, Educacional e Social (Rates), que obriga as cooperativas a reservarem parte de suas receitas líquidas a esse fundo.

Segundo ele, um estudo feito com mais de 50 cooperativas revelou que elas possuem acumulados o valor equivalente a 110% do seu capital social. “Isso faz com que muitas cooperativas cumpram a lei, constituindo o fundo, por um lado. Por outro, utilizam os recursos lá depositados para investir no capital de giro, em estoques, no imobilizado, entre outras coisas, menos em assistência técnica, educacional e social, como deveria ser”, questiona Dickel.

Medeiros acrescenta que ambas as questões – a capacitação para a gestão e a educação cooperativista – estão ligadas. “Não só as pequenas cooperativas, mas todas devem investir na gestão profissional e tecnologia, e também no fortalecimento dos seus valores e princípios, como grandes diferenciais de mercado”, aconselha. “O espírito de cooperação no Brasil melhorou, mas temos sempre o grande desafio de não perdermos a nossa essência, nossos valores e princípios. Vejo um desafio muito grande para a conscientização e educação cooperativista.”


Fonte: Revista EasyCOOP

 

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